A saudade é um dos temas recorrentes em mim. Assim como o o são o longe, o perto, o que se deseja, as decepções, as razões, a chuva, o êxtase, a alegria, a verdade, as decisões, et. al.
Isso me faz lembrar uma aula de Língua Portuguesa, que tive há não muito tempo aqui no Rio de Janeiro. O professor escolhia aleatoriamente um tema e cada aluno ia à frente da turma discursar durante 5 minutos sobre o tema escolhido.
Quando chegou a minha vez, já ao fim da aula, não havia mais temas na lista do professor. Ele iria me pedir para falar em "luto", mas, depois que alguém o lembrou de que esse tema já havia sido usado, ele modificou para "festa".
Sempre acho mais difícil falar sobre a alegria, porque é um sentimento óbvio. Quem está alegre faz festa. Porém quem está triste pensa, reflete. Já disse há muito tempo o pensador do livro de Eclesiastes que "Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, porque naquela está o fim de todos os homens, e os vivos o aplicam ao seu coração." (cf v. 7.2)
Fiquei de pé, dirigi-me à frente da turma, e pensei durante alguns segundos. À minha mente não vinham danças, nem comemorações, nem banquetes, nem festas de aniversário. Mas me veio a lembrança da chuva que cai nas tardes quentes de Belém do Pará.
Penso que a saudade é aquilo que faz cantar a alma. É aquilo que coloca a alma (e não o corpo) em festa. Acho muito curioso, por exemplo, a maneira como o carioca, em geral, não gosta de chuva. Costumo dizer que os cariocas, quando chove, ficam deprimidos. De fato, eles não saem de casa, ou saem por obrigação e passam o dia resmungando e dizendo que preferem o sol.
É claro. O sol, para o carioca, é festa. A cidade do Rio de Janeiro, nos dias ensolarados, fica mais bela, mais aproveitável, mais visível (e a cidade do Rio é uma cidade que precisa ser vista de longe). Sem falar nas praias. O sol coloca a alma do carioca em festa. Em contrapartida, a chuva é como se trouxesse o luto.
Nos primeiros anos morando no Rio, eu não conseguia entender isso. Para mim, um paraense de Belém, chuva é essência, lembrança e vida. Em geral, para o papa-chibé (belenense), a chuva coloca a alma em festa.
Existem poucas coisas boas como tomar banho de chuva numa tarde quente, de pés descalços. Ou então sentar-se do lado de dentro da casa e ver a chuva, ora pingando, ora jorrando pelos telhados e condutores. Ou então observar as nuvens negras cobrindo o céu no meio do dia, parando o vento, fazendo as luzes da cidade se acenderem, e derramando-se minutos depois em deliciosas chuvas torrenciais.
Poucas coisas são tão boas quanto, depois de uma forte chuva equatorial, assistir o céu se abrindo e o sol brilhando novamente. Só sabe quem já viu.
A saudade para mim não é luto. Saudade é trazer para perto o que não mais está perto. Saudade é presença, é certeza. Saudade é festa.
os montes, ah! os montes... / contam histórias tão distantes / de açaizeiros, igarapés, / dos tempos de antes, / lembranças, sussurros e saudades / aos montes. (Minas Gerais, rodovia Rio-Brasília, 20 de dezembro de 2005)
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Um comentário:
D+ seu texto! acho que chover no Rio ofusca um pouco a beleza que existe lá, e os coriocas não conseguem curti tanto as lindas praias. Quanto aqui em SP,muitas vezes depois da chuva não tem muito o que comemorar,principalmente no trânsico. Ah...mas em Belém, chover sempre foi uma festa, seu texto me fez lembrar que em tempos de mlk eu meus irmãos e amigos, nos divertíamos muito nos dias de calor seguidos de fortes chuvas no final da tarde, sentindo o vento, procurávamos algumas biqueiras que jorravam tanta água que parecia lavar a alma. Muitaaaaas saudades de Belém e daquele tempo.
Parabéns!
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